sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Mariana





Mariana 
Bruno Ribeiro, 16/02/2004
Mariana. O nome já diz tudo. Pronunciá-lo é como entoar um mantra ou andar com pés descalços na beira do mar. No próprio nome do nome, em sua sonoridade, derrama-se poética a paisagem litorânea do Brasil, com seus verdes varados de vento, suas asas de gaivota e seu aroma marinho. Se fosse uma música, seria chorinho. Se fosse uma cor, a do arrebol. Mariana, não por acaso, é a preferida de nossos compositores. Cantada por muitos, mas conquistada por poucos – como convém a todos os seres que são livres, como os gatos de rua. Mariana tem alma felina, das que se estendem ao sol, nos telhados, e copulam sob a lua, nas sarjetas. Parece até que o nome acaba moldando a pessoa e toda Mariana nasce linda e louca. Pouco dada à poesia – porque não se pode compreender o que já se é – vai em passos de hai-kai, pisando nas minúsculas flores do campo que lhe devoto. E me diz que a vida é feita de coisas práticas. Em Mariana, o poético é elemento telúrico, como os minerais que sustentam o solo brasileiro. Enquanto Mariana dorme, debaixo do céu que é para todos o mesmo céu, velo por seu corpo, na noite alta e desperta, debruçado à varanda que abençoa o Largo das Andorinhas. Enquanto dorme Mariana, ouço zumbir a corrente elétrica que passa dentro da parede e sinto nela a queixa das serenatas de outrora, nunca havidas entre nós, para sempre desaparecidas do livro sagrado de nossa juventude. E as serenatas me dizem que ninguém se chama Mariana impunemente. Tento ser um bom homem por causa dela, mas o limoeiro que o avô plantara no canteiro úmido da memória (exalava um perfume infantil), foi morto pela especulação imobiliária. O capitalismo não nos deu um avô, nem um solo de bandolim. Dentro do apartamento, que é meu Quadrilátero do Pecado, uso o sapato bicolor da teimosia. Sou radical em tudo, inclusive na paixão. Posso submergir no lago profundo que existe nos campos outonais dos olhos de Mariana. Eu tenho muitos vícios, é verdade, mas não preciso deles quando estou ao lado dela. Ela me ensina a andar elegante, como os antigos malandros da Lapa. Ela me ensina a tomar mais coca-cola e menos rum, a ver o lado bom da democracia, da música eletrônica e dos vestidos de noiva. Mas eu sou radical em tudo e não concordo, só para vê-la com os olhos brilhantes de quem padece de uma permanente febre. Às vezes eu a elogio, dizendo que fica bonita quando veste azul, mas, na verdade, quando veste Mariana é o azul quem fica mais bonito. Nem sei se abraço Mariana, quando a enlaço pela cintura, ou se abraço todo o azul infinito que há ao redor de seu corpo. Abraçar Mariana é como abraçar o mundo. E só quem abraça Mariana como eu, sabe que o beijo é um precipício e que, se não se aprende a voar rapidamente, se estatela de cara no chão. Sem saber, ela compensa a ausência de deus e recria o meu universo. Me leva de asa-delta para a China, me inclina a ser bom com os tolos, me usa de cobaia em suas experiências malucas e gosta quando eu lhe mordo a nuca, distraído, na fila do Cine Paradiso. Sinto-me eternamente deitado em berço esplêndido. Quando estamos de mãos dadas, descendo a Barão de Jaguara rumo ao Café Regina, quando comemos um pastel no Voga ou cantamos um samba do Cartola no Mercado Municipal, sinto-me o agente histórico da mais bela crônica jamais escrita pelos homens. Mariana me situa no tempo e eu sinto o ímpeto revolucionário dos suicidas que se matam por amor a vida. Com seus olhos de rainha da Espanha, jabuticaba sobre o marfim, faz com que todo meu ser se eleve. E a vida me seja leve, enfim. 
Bruno Ribeiro 

P.S: Não sou a Mariana do poema. Meu amigo me enviou. Achei interessante e resolvi postar,espero que vocês gostem.

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